top of page

A Chegada

Vem dizer o que sente

a carne ainda viva

pelas dores

pelas noites

pelas faltas


Vem chorar todas as lágrimas

as torrentes

pelas separações prematuras

pelos amores perdidos

pelas feridas abertas


E se nelas tocarem, abruptos

sem perguntarem se ainda dói

sem olharem por onde pisam

sem considerarem a criança


Vai atirar pedras,

endurecer, xingar, cuspir,

gesticular, urrar, gritar:

- Não!


Precisam saber, ainda que sangre

que do cansaço brota a serenidade da força

que o sofrimento deu consistência ao corpo

que ela agora conhece a coragem, e cuida de si;


tocou com os pés o fundo, afogando-se

engoliu água, sentiu na garganta a areia

e foi só quase viva que chegou à beira da praia

e não há de se afogar em poça d’água:


vai respirar fundo, o seu ar

vai sobreviver mais uma vez

furiosa e triunfante

pedra macia e resistente

parida como poema.



setembro de 2021


Comments


bottom of page