de Altair Martins
Diadorim Editora - 2021
Ontem li Labirinto com linha de pesca, de Altair Martins, recém-lançado pela Editora Diadorim. Ele vem dividido em seções: paisagens, seres, palavras, cenas, retratos. Quando cheguei em palavras, adivinhei que ali seria capturada de vez. Seria levada pelo labirinto.
O livro vai envolvendo numa crescente, porque é aos poucos, a cada curva desse labirinto que a poesia se mostra - e também se torna enigma. É uma poesia nada óbvia, em cujos versos é possível se perder. Muitos poemas, quando se encerram, deixam aquela sensação de que precisam ser relidos. Mas não todos. Labirinto. Por onde seguir?
O título (maravilhoso) já convida ao mesmo tempo que intriga. Quando li, pensei: como assim, labirinto com linha de pesca? Se a pesca é jogar o anzol com a isca para o imenso do mar ou o fundo do rio (o fundo do mar, o imenso do rio) jogar o anzol diante de alguma amplitude, enquanto o labirinto é todo cheio de curvas sinuosas, onde não se vê a amplitude nem o fundo, só a visão curta, estreita, diante das paredes que confundem, a dúvida crescente e aflitiva sobre qual caminho escolher?
Lembrei muito de Clarice Lispector em Água Viva, por pura associação livre: "Então escrever é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando essa não-palavra - a entrelinha - morde a isca, alguma coisa se escreveu."
A poesia do Altair Martins é pesca no labirinto. E o amor é sempre pela palavra. Nossa isca.
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Morfologia da dor
Esfaquear a palavra dor,
fazendo brotar o nanquim da palavra morte,
sem dizer um ai nem acender cheiro de velas.
Então, do frio da palavra corte,
escorrer o vermelho da palavra sangue
(o sangue da palavra).
Com a ponta do verbo riscar,
esboçar a herança da palavra significado
e escrever epitáfios
com o sopro da palavra alívio
e o verniz de algumas outras palavras.
Publicada em junho de 2021, no Instagram
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